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domingo, 17 de abril de 2011

Égua de ti, Belém!

Tão mais fácil seria, se não fosses tão linda.

Um caminho entre a Casa das 11 Janelas e o Forte do Presépio


Já é sabido por alguns que fui-me embora pra Pasárgada. Não que aqui eu seja amigo do Rei, ou que eu tenha a mulher que quero na cama de minha escolha. Acontece que em Belém as coisas não deram muito certo pra mim, alguns fatores com que contava foram cancelados... outros eu nem me dei o trabalho de ir atrás, confesso.

Enfim. Estou de volta a São José dos Campos - São Paulo
a última semana em Belém foi uma semana de despedidas. E de um namoro sereno
, calado e sincero entre eu e minha cidade.

Está sendo muito difícil escrever, não só pelo fato de eu não saber fazê-lo, mas, dessa vez, em especial, as palavras simplesmente não cabem em mim. Descrever decentemente o indescritível é sempre um desafio, principalmente por se tratar de algo impossível, mas é deveras fácil resumi-lo... é o que vou tentar fazer agora.

E sucedeu que na Segunda feira (14 de Março) eu precisei resolver algumas coisas no centro da cidade. Tomei um micro ônibus, daqueles climatizados pois o calor estava forte. Então, mais que de repente, algumas coisas tão simples e corriqueiras me pareceram tão especiais e insubstituíveis.

De cara, sem mencionar o próprio micro ônibus com adesivo de vitória-régia na frente do Shopping Castanheira, avistei pela janela o clássico duelo épico no semáforo em frente ao mesmo Shopping. Multidão enlouquecida, esperando nervosamente por intermináveis 3 minutos de sinal verde e uns poucos quebrados de amarelo. De um lado todos loucos pra adentrar ao Shopping, do outro todos loucos pelos disputados Icuí Ver-o-peso, Cidade Nova IV, Curuçambá e derivados que ameaçavam arrancar antes mesmo do sinal enhulkecer-se.

Nem o ar condicionado interno dava jeito no calor, cansei de Benjamin, resolvi olhar a rua. O sol, ainda alto e tímido por de trás das nuvens, ensaiava sua descida a esta altura. O celular dizia-me16 e uns quebrados. Sobe a senhora falante, todos afastam. Sobe a gostosa tímida, todos se achegam e torcem para ela sentar do lado. Na praça os esportistas, do gordo esforçado ao magro narciso. No céu o Sol deu enfim as caras, logo me animei. Com a máquina na mochila dei seguimento a minha viagem até o Forte do Castelo.

O Complexo Feliz Lusitânia é uma das áreas de que mais me agrado em Belém. Um caminho convidava a quem quisesse juntar-se ao show explícito. O sol, agora a 45º da minha vista, fez da Baía espelho. O trânsito de barcos era intenso. Não sei se barcos cortavam a água, ou se naves o céu, só sei que, não fosse pela linha verde e infinita no horizonte, eu diria que céu e água se enamoraram e consumiram-se num corpo só.



A baía convida

Enfrentamento desleal

Equilíbrio

Naves no céu


Um casal namora à beira, como quem imita o namoro entre o céu e baía.

Casalzin

Continuei caminhando, agora em direção ao Ver-o-peso. Sempre com pressa, mas sem abrir mão de aproveitar cada segundo. Assim, naquele fim de tarde, fui absorvendo a cidade de todas as formas possíveis.

O Ver-o-peso fedia a pitiú, como diria o caboco. Curioso como eu sempre prendia a respiração toda vez que era obrigado a passar por ali de ônibus ou qualquer outro automóvel. Mais curioso ainda é como eu, mais do que tudo, queria guardar aquele fedor horrível de peixe na memória de minha narina, caso a mesma possua uma memória. Como quem não se contenta em absorver a cidade através dos olhos eu tentava enfiar a qualquer custo aquela paisagem nariz adentro.
Um homem suado quase esbarrou em mim, um cego talvez o confundisse com um peixe andando. Urubus confraternizavam e conversavam loucamente após o lanche da tarde, alguns, talvez os mais velhos, descansavam no topo de construções antigas, postes e semáforos.

O pós banquete

Conversa amistosa

Emaranhado



À frente meu caminho seguia. No peito brincavam tristeza e alegria. Na avenida o trânsito fluía. Do ônibus uma senhora sorria. À calçada um mendigo dormia. Na banca castanha, tucupi e farinha. No horizonte o sol já descia. Minha pressa não andava, corria. E nesse texto, Deus, chega de rima.
Temia não chegar a Estação das Docas à tempo, ainda era de minha intenção absorver a cidade pela boca, também

No mercado se deu o ápice do namoro. Pelo nariz o cheiro infinito de todas as coisas amazônicas. Pelos ouvidos os ônibus, feirantes, vagabundos, a baía na encosta. Pelos olhos mil cores, do chão às barracas, do tucupi ao azul marinho na camisa do Remo. Nas mãos castanha, farinha, muruci, texturas infinitas. Na boca um bombom de cupuaçu. A cidade, agora, invadia todos os meus sentidos e me envolvia de uma maneira arrebatadora, assim nós - cidade e eu -  nos sintonizamos em uma frequência bem além de qualquer uma que eu já havia estado. E sem vergonha, sem frescura e sem pudor, ali mesmo, na frente de todo mundo, nós fizemos amor... devo dizer-lhes que foi a melhor sensação dos últimos tempos da última semana.

É extremamente difícil descrever o que senti ali... fui tomado por uma euforia silenciosa, mas não contida. Tantos sentimentos juntos, fazendo o maior estardalhaço no meu peito, e eu não tinha outra forma de colocar pra fora senão através da minha máquina. O telefone tocava justamente na hora H, como a mãe que não tem o hábito de bater a porta do quarto, mas resolve fazê-lo bem na hora do rala e rola. Rapidamente contornei a situação e voltei-me pra minha amada: onde paramos?

Pra trás ia ficando o Mercado de Ferro

Mar de lona

Velho Veropa

Um senhor observava minha pouca vergonha... virou-se pra ver o cargueiro que apitava passar

Recolhendo

Lá vem


E como quem sabe do meu rumo, um homem aponta o caminho

Acolá

Na estação das Docas o Sol já se punha a descansar. O cargueiro, antes observado pelo senhor, também fez o mesmo

Descanso

 Outro casal namorava... me parece uma cena comum no pôr-do-sol da orla

Mais casalzin

Os já tradicionais guindastes

No contraluz

Pelo vidro espelho

Olha eu

Corredor famigerado


Nas Estação as já conhecidas figuras. Turistas, namorados, deprimidos a procura de uma bela vista, adolescentes espinhentos, matadores de aula e derivados.
Nas mesas torres de Choop, sorvetes. Um turista paquerava sua própria guia. Um casal, ela gostosa e ele quase idoso, caminhavam tranquilo. Pensei que ela fosse mulher da vida, ou ele muito rico. Pensei que ela tivesse um bom coração, e pensei que ambos fossem pai e filha, e pensei que isso não era da minha conta.

Fui a Cairu. Lá o já tradicional Pavê de Cupuaçu. Sentei-me, olhei as coisas, senti as coisas, acalmei-me. O Sol se pôs em fim. Despedi-me dela. Dela que, me pareceu, não veria tão breve... Belém.

No dia 19 eu parti. Lá vai ele de novo... sem dinheiro no bolso, na mochila a câmera e um sonho, no peito uma saudade precoce, nos olhos um futuro distante, na nuca uma cidade maravilhosa.



Égua de ti.

8 comentários:

  1. *.* sem palavras meu querido poeta!

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  2. Phelipe, um Fotografo é um poeta que escreve com clicks, mas nada a reclamar se escreve também com as idéias..

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  3. Sem palavras.., pois as tuas já dizem tudo e algo mais!
    Parabéns! Vc tem muito talento.
    Que bom que vc nos dá a alegria da sua presença pelas bandas de cá.
    :)

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  4. Deixou Belém, deixou a Thais... Deixaste as mulheres da tua vida aqui.
    Muito bonito, Phelipe.

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  5. Um dia tu vai ser meu guia por essa cidade, de outro jeito nem quero ir.

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  6. tu tá na categoria dos melhores, cunhado! pode acreditar! Essas fotos me tiraram o ar, e teu texto tão apaixonado me deixou envergonhada. Um abraço de urso cheio de saudade! Que orgulho de ti! Que orgulho!

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  7. Adorei o texto, adorei as fotos me saciaram em um domingo nada feliz em SP. Parabéns!!! Já que não posso ter Belém, que ela me tenha então.

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